Estimativa
do Sexo e os contrastes atuais
Recentemente
falamos sobre a Antropologia Forense. Mesmo sendo um meio secundário de
identificação, não podendo, portanto, estabelecer uma identidade, auxilia na
estimativa de sexo, idade, altura e ancestralidade, facilitando o caminho para
os métodos de identificação primários. Hoje nós vamos falar sobre estimativa do
sexo!
Se você estiver tão animado(a) quanto a Bailey, acho melhor eu começar... Através de aspectos morfológicos e morfométricos do esqueleto é possível diagnosticar o sexo com segurança. Como muitos de vocês já imaginam (ou já sabem mesmo), a pelve ou bacia representa o segmento do esqueleto com maior dimorfismo sexual, ou seja, diferença entre os sexos no que tange as características não sexuais. Em muitos casos, especialmente em desastres em massa, a pelve pode não estar presente, fazendo-se necessário utilizar apenas o crânio e a mandíbula, que permitem um diagnóstico diferencial do sexo em grande parte dos casos. By the way, não é a análise de uma característica pontual que permite a estimativa do sexo não, tá!? É preciso a análise de um conjunto de características para termos a estimativa mais confiável possível. Agora vamos falar um pouco sobre esportes, mas se você não curte muito, fique por aqui que já, já eu volto a falar sobre estimativa do sexo.
Tiffany
Abreu. Tia Thompson. Mack Beggs. O que têm em comum? São atletas transgêneros. O
Comitê Olímpico Internacional (COI), em 2015, estabeleceu regras para a
inclusão destes atletas. Para mulheres transgêneros, as regras exigem o
controle dos níveis de testosterona sanguínea abaixo de 10 nmol/L, por no
mínimo, um ano. Já para os homens transgêneros, não existe impedimentos,
acreditando-se que tais não adquirem vantagens físicas expressivas. Sabendo que
os níveis do hormônio testosterona que as mulheres normalmente apresentam gira
em torno de 2 a 3 nmol/L, você deve se perguntar se o nível máximo de 10 nmol/L
ainda não conferiria vantagens físicas, não é? Sabendo da possibilidade do
homem possuir mais receptores para testosterona, podendo até mesmo apresentar
um organismo mais responsivo a ela, suas dúvidas com certeza aumentaram. As
regras para as Olimpíadas de Tóquio permanecem incertas.
Tiffany Abreu
Uma
certeza que podemos ter é de que as publicações científicas ainda são escassas
acerca dos transgêneros, sendo necessário conclusões mais sólidas para o meio
esportivo. No Brasil, o panorama de produção científica sobre a transgeneridade
tem se mostrado crescente, em comparação com épocas anteriores, mas ainda é
escasso no que se refere as transformações morfológicas em decorrência da
mudança de gênero.
Você
deve estar se perguntando onde a Antropologia Forense e a estimativa do sexo
entram nisso tudo, não é? Pois bem. Como já mencionado, o esqueleto possui
segmentos específicos muito úteis para a estimativa do sexo. Onde a
transgeneridade entra nisso tudo? Faz-nos pensar até que ponto alterações
morfológicas provenientes da mudança de gênero podem influenciar na estimativa
do sexo. É importante deixar claro que a mudança de gênero em adultos,
favorecida pela suplementação ou supressão hormonal, não interfere de maneira
expressiva no sistema musculoesquelético, ou seja, ossos com características
femininas não podem assumir uma conformação masculina apenas com suplementação
hormonal na fase adulta, tendo em vista que estas alterações só ocorrem de
maneira expressiva na puberdade. Até existem estudos que comprovam a redução da
força muscular e da densidade óssea em mulheres transgêneros que passaram por
supressão hormonal, no que se refere a performance física. Mas ainda persiste a
dúvida do quanto, de fato, isto pode interferir na realidade da Antropologia
Forense nos processos de identificação humana.
Por
que eu falei disso tudo, então, já que os efeitos hormonais no que tange as
alterações morfológicas na fase adulta são mínimos? Porque a mudança de gênero
tem sido uma realidade bastante presente entre crianças e adolescentes.
Compreendendo que seu sistema musculoesquelético ainda está em desenvolvimento,
começamos a pensar o quanto o aporte de hormônios pode interferir nisso tudo.
Vamos
falar agora sobre o perfil biológico estabelecido para ambos os sexos. Eu e
você conhecemos características morfológicas que são atribuídas aos homens,
assim como as atribuídas às mulheres. Você consegue pensar em pessoas que fujam
a este padrão? Posso citar Nina Braga Nunes, irmã de Gabriel Braga Nunes. Um
relato de Gabriel acerca de uma peça em que ele interpretava uma mulher nos diz
que bastava ele colocar uma peruca que ficava parecido com a irmã. Eles sempre
se acharam parecidos. Este é um bom exemplo ao mostrar uma mulher, que por
parecer com o seu irmão, apresenta traços masculinos. A comparação contrária
também é válida? Deixo esta análise com você!
Nina e Gabriel Braga Nunes
Devemos
ainda considerar que a atividade laboral de homens e mulheres mudaram muito com
o decorrer do tempo. Muitos homens passaram a realizar trabalhos que não exigem
necessariamente força braçal, enquanto as mulheres começaram a assumir jornadas
até então não enfrentadas. Quanto tempo você acha que será necessário para que
as mudanças morfológicas decorrentes disto possam ser notadas e passem a
interferir no serviço da Antropologia Forense? Uma coisa é certa: a ciência não
foi feita para responder questões que estão fora da sua esfera de competência.
Isso pode acabar levando-a ao descrédito. Mas outro fato é mais certo ainda:
exigimos muito pouco dela e devemos acreditar que ela ainda tem muito a nos
oferecer.
Tifany Shela Albuquerque Borba de Andrade
VANRELL,
J. P. Odontologia Legal e Antropologia Forense. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora
Guanabara Koogan; 2019.
RODRIGUES,
N. G; SILVA, C. H; ARAUJO, I. S. Visibilidade de pessoas trans na produção
científica brasileira. Reciis – Rev Eletron Comun Inf Inov Saúde. Rio de
Janeiro, v. 13, n.3, p. 658 – 670, 2019.
McGRATH,
A. Surpreendido pelo sentido. São Paulo: Hagnos, 2015. p. 12.
PROTA, L. Transgêneros: a Ciência Por Trás da Determinação do Sexo no Esporte. O Cientista do Esporte, 2018. Disponível em: https://globoesporte.globo.com/sportv/blogs/o-cientista-do-esporte/post/a-ciencia-por-tras-da-determinacao-do-sexo-no-esporte-parte-2.ghtml.