Um dos maiores desafios da vida contemporânea é viver no tempo presente. A “ansiedade crônica” nos leva frequentemente ao futuro e a “depressão aguda” ressuscita um passado vívido. Eu falo desse cenário como adulto (nem tão adulto assim kkk), mas você já imaginou as consequências de uma criança não viver no seu próprio tempo de infância?
Pois é, as consequências não vêm todas de imediato. E é justamente na vida adulta que esse “serzinho” de hoje não conseguirá lidar com seus conflitos internos tão facilmente, podendo desencadear quadros psiquiátricos e sofrimento mental para o resto da vida. Mas quais são as situações em que uma criança não vive sua infância?
Podemos separar convencionalmente em dois tipos:
- Infantilização
- Hipersexualização
Os dois problemas são complexos e multifatoriais. Não é somente o nível de escolaridade dos cuidadores, nem tampouco a localização geográfica onde a criança nasceu que vai desencadear sozinho esse tipo de exposição. Infelizmente esses temas ainda são bem estigmatizados e sofrem dificuldade de inserção no diálogo de pais e cuidadores em escolas, programas de TV, redes sociais e principalmente dentro do núcleo familiar. A infantilização é algo crescente no Brasil e, quando discutida, vai pela via de raciocínio do número cada dia maior de “mimados aos 30 anos”, mas também sabemos que esse não é o único desfecho. Já a hipersexualização é mais difícil de ser trazida à tona, e é nessa ferida que eu quero tocar agora.
Venho do sertão da Paraíba, minha infância inteira (e a de todos os meninos amigos, colegas, inimigos, conhecidos e considerados) foi vivida com uma diferença de tratamento por gênero. Enquanto as meninas eram infantilizadas, estimuladas a brincar de arrumar a casa da boneca aos 13 anos, os meninos eram hipersexualizados aos 9, com ideais de ser o namorador ou coisa parecida. E isso não estava acontecendo somente lá no sertão da PB!!! À época eu era fã de uma banda infantil chamada “Mulekada”, composta por 1 menino sempre no meio do trio com ares de protagonista, e 2 meninas que passavam imagem de inocência e quando tinham oportunidade de destaque era cantando “quero seu amor de menino” direcionado ao tido como verdadeiro protagonista, enquanto ele mandava elas “requebrarem gostoso, rebolar a bundinha e ir até o chão”
Mas a hipersexualização também chegava igualmente nas meninas, esse mesmo grupo cantava músicas de bandas compostas por adultos e apenas reproduzia para as crianças que: “Tudo que é perfeito / A gente pega pelo braço / Joga ela no meio / Mete em cima / Mete embaixo / Depois de nove meses / Você vê o resultado”. Também houve a época em que a população se referia ao grupo infantil como sendo composto pela miniatura do grupo “É o tchan”, sucesso no início dos anos 2000, com o dançarino “Jacarezinho” e as “mini loiras” do Tchan.
Pois é querid@s leitores, (sobre)vivi isso aí! Mas hoje, 20 anos após o boom da Mulekada, as ferramentas de entretenimento já são outras. O que continua imutável é a busca por monetização utilizando crianças e adolescentes hipersexualizados, já que infelizmente existe gente que consome o conteúdo e o torna sustentável.
Sabemos que a pornografia infantil é crime no Brasil tipificado nos artigos 218-C do Código Penal Brasileiro e 240 a diante no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Mas o que pouca gente sabe é que Infantilização e Hipersexualização são tipos de violência infantil que podem ter interpretações penais baseadas no ECA. Apesar disso, vemos no Instagram, TikTok e até mesmo no whatsapp, uma confusão quando se classifica algo como “haaa, deixa de mimimi, você é muito intolerante”, frente a uma situação de erotização precoce que não cabe nenhum tipo de brecha ou tolerância. A cada “voto” de tolerância que as pessoas dão no Whatsapp/Instagram, é um passo adiante na normalização do anormal e, indiretamente, uma “voz” a mais no fortalecimento de um mercado bilionário financiado em Bitcoins que acontece na DarkWeb, uma camada profunda da DeepWeb onde crimes são facilmente cometidos e encomendados.
A Odontologia tem papel importante na notificação da suspeita de qualquer tipo de violência infantil, é dever do profissional ativo registrado em conselho. Além disso, também vem contribuindo junto às ciências forenses no desenvolvimento e aprimoramento de técnicas capazes de estimar a idade de uma pessoa por medidas realizadas na face, em imagens (Fotoantropometria). Essas metodologias podem ser aplicadas para constatação de crimes de pornografia infantil, já que a materialidade acessível da maioria dos casos são as próprias imagens de um determinado arquivo digital. Mas nem sempre as imagens são de boa qualidade e a angulação da face é favorável para fazer a marcação dos pontos a serem medidos, portanto cai aqui por terra mais uma do “Efeito CSI”.
E se você nunca ouviu falar em “Efeito CSI”, confere lá: https://laolufpb.blogspot.com/2020/08/o-que-e-de-fato-pericia.html
Então, car@s terráque@s, se eu fosse vocês a partir de hoje, daria uma olhada crítica nos perfis do Instagram que andam seguindo e nas figurinhas do whatsapp que estão utilizando…
...e também iria correndo seguir a @Jinmiran_, para acompanhar o que tem de mais fofo e puro no cotidiano de uma criança que vive no seu tempo de agora!
Johnys Berton Medeiros da Nóbrega.
https://tenor.com/view/baby-jin-miran-gif-20514010
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm