Durante o processo de identificação em corpos em avançado estado de decomposição, a antropologia é de suma importância por fornecer conhecimentos teórico-práticos essenciais para se levar a uma identidade. A estimativa da altura é um método em que conseguimos obter informações claras e objetivas podendo excluir ou afirmar a identidade, levando em consideração em conjunto a outros métodos.
Frequentemente os Institutos de Medicina e Odontologia Legal recebem ossadas para analise e identificação onde muitas vezes se encontram incompletas. Em casos que temos a presença de ossos longos podemos fazer o uso de metodologias osteométricas conforme encontramos na literatura, no qual a partir de medidas pré-estabelecidas podemos estimar a altura do indivíduo tomando como base determinado osso (fêmur, tíbia, por exemplo).
Mas em casos em que apenas o crânio é encontrado os conhecimentos antropológicos do odontolegista são imprescindíveis, pois tudo o que resta são as informações que poderão ser fornecidas pelos elementos dentários. Diante disso, Carrea (1939) realizou estudos que proporcionaram dados odontométricos relacionados com a estimativa da estatura, fundamentando-se na proporcionalidade entre os diâmetros dos dentes e a altura do indivíduo. Tal procedimento possibilita o cálculo da estatura nos casos em que dispomos da fragmentação do cadáver. Mas como esse cálculo se limita a mensuração apenas dos dentes da mandíbula, nos casos em que apenas o crânio é encontrado podemos fazer o uso do Índice de Carrea modificado por Lima (2011) que permite a obtenção da estimativa de altura através dos dentes do arco superior também. Aumentando a possibilidade de maiores informações durante o processo de identificação.
Josef Mengele era o filho mais velho de Karl e Walburga, estudou medicina e antropologia e depois de concluir dois doutorados, passou a pesquisar no Instituto de Biologia Hereditária e Higiene Racial em Frankfurt. Em meados de 1940, Mengele entrou voluntariamente para a SS, a tropa de elite nazista, sendo três anos depois transferido para Auschwitz.
O médico do campo de concentração era particularmente ativo no processo de seleção na rampa de entrada. Um grupo formado por gêmeos, anões e deficientes físicos era usado como cobaia de seus experimentos macabros no pavilhão batizado de "zoológico". E suas pesquisas, que não contribuíram para a ciência, consistiam em testar os limites do ser humano em temperaturas muito altas ou injetar cimento líquido nos úteros das prisioneiras para avaliar os efeitos da esterilização em massa. Por isso, Mengele foi apelidado de “Anjo da morte”.
Em 17 de janeiro de 1945, quando tropas soviéticas estavam a dez dias de tomar Auschwitz, Mengele fugiu em direção ao oeste, sob o pseudônimo de Fritz Ullmann. Em junho de 1949, seguiu para a Argentina, onde trocou novamente de identidade e virou Helmut Gregor. Quando a Alemanha pediu sua extradição, fugiu para o Uruguai. Em 1959, migrou para o Paraguai e, dois anos depois, para o Brasil. Em 1979, Josef Mengele morreu afogado após sofrer um mal súbito na praia da enseada – SP e sua morte foi mantida em segredo pela família durante anos.
Em 31 de maio de 1985, a polícia invadiu a casa de Hans Sedlmeier, amigo de Mengele, e encontraram um livro de endereços codificado e cópias de cartas para Mengele. Entre os jornais estava uma carta de Bossert notificando Sedlmeier da morte de Mengele. Sob interrogatório, os Bosserts revelaram a localização do túmulo e os restos foram exumados em 6 de junho de 1985.
A ossada encontrada apresentava uma série de vestígios do período em que Mengele serviu o exército e de problemas de saúde sofridos por ele durante seu exílio. Segundo Muñoz, legista que exumou o corpo, graças aos registros médicos de Mengele, os patologistas sabiam, por exemplo, que ele havia sofrido uma fratura na pelve durante um acidente de motocicleta em Auschwitz, sendo essa fratura encontrada na ossada e, também, que ele sofreu com abscessos dentais, que ele mesmo tratava com uma lâmina afiada, o que resultou em vestígios no crânio. Também foram encontrados traços de fraturas curadas no ombro, na clavícula e no polegar direito, o crânio contava com um pequeno furo no zigomático esquerdo, possível consequência de uma sinusite crônica sofrida pelo Anjo da morte. E dentre os métodos utilizados da antropologia forense nesse caso, podemos destacar a estimativa de altura que a partir da mensuração de ossos longos ou através do uso do índice de carrea para os elementos dentais da mandíbula, foi possível estimar a estatura de Mengele contribuindo para a obtenção de informações e elaboração do laudo antropológico e identificação do mesmo.
Em 1992, testes de DNA confirmaram a identidade de Mengele. Hoje, os ossos permanecem armazenados no Instituto Médico Legal do estado de São Paulo e são utilizados como auxílios educacionais durante os cursos de medicina forense da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Carrea JU. Talla individual human en función al radio cuerda. Ortodoncia. 1939; (6): 225-227.
FRANÇA, G.V. Medicina Legal. 11. ed. Rio de Janeiro : Guanabara Koogan, 2019.
LIMA, LaÍse Nascimento Correia. VALIDAÇÃO DO ÍNDICE DE CARREA POR MEIO DE ELEMENTOS DENTAIS SUPERIORES PARA A ESTIMATIVA DA ESTATURA HUMANA. 2011. 94 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Odontologia, Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2011.
Vanrell JP. Odontologia Legal e Antropologia Forense. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009.
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